Declínio e melancolia nos cassinos de Atlantic City
07/09/14 02:00“Você já viu um cassino morto assim?”, me perguntou um turista num dos corredores do cassino do Trump Plaza, em Atlantic City, na noite da última terça-feira (2).
Respondi “não” com um sorriso constrangido. Minutos antes eu havia passado (para fins de apuração, veja bem) no cassino do Caesars, que fica ao lado do Trump Plaza no lendário Boardwalk, e o movimento era bem considerável para um início de semana.
O cenário deprimente no Trump –com roletas e máquinas caça-níqueis às moscas e funcionários operando num misto de tédio e tristeza— é reflexo antecipado pelo que ocorrerá no próximo dia 16: o cassino será o quarto a fechar neste ano na cidade. Restarão oito no Boardwalk, sendo um deles do mesmo grupo do magnata Donald Trump, o Trump Taj Mahal.
O “Taj”, inclusive, –anuncia um cartaz espalhado por todo o Trump Plaza— receberá por algum tempo as fichas adquiridas no Plaza e se tornará a “casa” dos clientes que ficarão órfãos. “Foi um prazer ter você como nosso hóspede e apreciamos a sua lealdade por todos esses anos”, acrescenta o anúncio.
O Trump Plaza foi inaugurado em 1984, numa época em que já havia outros sete cassinos no Boardwalk – o “calçadão” à beira-mar imortalizado no jogo Monopoly e, mais recentemente, na série “Boardwalk Empire – O Império do Contrabando”, que tem como mote a ação da máfia no local durante a Lei Seca nos EUA (1920-1933).
Os cassinos foram legalizados em Atlantic City em 1976. Nas décadas de 80 e 90, a cidade, que sempre foi o polo desse tipo de atividade na costa leste americana, chegou a superar, em arrecadação com jogo, sua concorrente Las Vegas (que fica em Nevada, no oeste do país).
No entanto, nos últimos anos, com a legalização de cassinos em Estados vizinhos e o abalo causado pela crise de 2008, o Trump Plaza, o Showboat e o novato Revel (que fecharam no último fim de semana) e o Atlantic Club (fechado em janeiro) não aguentaram a concorrência.
>> Veja matéria publicada no jornal deste domingo aqui.
No Trump Plaza, o clima já era de total melancolia a duas semanas do fechamento. No lobby, duas das três lojas já estão fechadas. A única que sobrou, de joias, oferece colares, brincos e pulseiras com até 80% de desconto. Vi uma chinesa comprando mais de dez peças, tamanha a surpresa e satisfação com a barganha.
A piscina também já está fechada. Chateada, a mãe com três crianças em trajes de banho foi confirmar com a recepcionista se era isso mesmo. “Infelizmente, agora a piscina só abrirá no fim de semana”, respondeu a funcionária, sem graça. Seriam só mais dois fins de semana até o fechamento.
Dos três restaurantes do hotel, apenas um segue aberto. A enorme remenda no estofado do sofá indica o descaso que maltratou todo o complexo nos últimos anos.
“É o momento mais triste da minha vida”, desabafou Stancy, que trabalhou no Plaza em 30 dos seus 72 anos, atrás do balcão de um quiosque de souvenires. Diz que provavelmente vai se aposentar, apesar de não querer.
É o que deve acontecer com uma importante parcela dos funcionários do hotel que tem mais de 65 anos –a maioria deles exerce funções como a de Stancy, ou ainda de garçom e vigia.
Para outros, como a recepcionista Sonia, 57, o futuro permanece incerto. “Foi um golpe. Trabalhei aqui 20 anos da minha vida, atendendo os clientes. Mas estou muito nova para me aposentar”, disse. “Preciso arrumar um outro emprego, mas estou pensando em algo de meio período. Não quero mais cassino depois dessa experiência.”
Tem sido sobre isso a conversa de quase todas as pequenas aglomerações de funcionários pelos corredores do hotel e do cassino nos últimos dias. Nos rostos, é possível sempre ver a expressão de lamento.
É de se esperar para o Plaza uma despedida tão comovente quanto foi a do Showboat, no último domingo (31). Após 27 anos, o cassino encerrou suas atividades com uma noite carregada de emoção. “Os nossos clientes cativos nos abraçaram e choramos juntos. Era gente que estava sempre aqui, que sabia o dia do aniversário dos nossos filhos”, disse a atendente de bar Ruth Ann Joyce, 58, que trabalhou no Showboat desde o início.
No caso do Trump Plaza, os hóspedes também já entraram no clima de “funeral” e passaram a se cumprimentar nos elevadores com variações sempre constrangidas de um “é, então é isso…”
Por enquanto, os três luxuosos lustres de cristal da entrada, no entanto, seguem ligados. É a garantia de um resto de dignidade ao cassino que já foi um dos mais imponentes do Boardwalk.